domingo

Ela e ela - Antonio Prata





Fui apaixonado pela Luana da primeira à quarta série. Lembro daquela época como se fosse uma novela mexicana: pernas bambas no recreio; rápidos toques, desajeitados, no pega-pega; noites sem dormir, com um nó na garganta, só pensando nela. Amar é mesmo uma encrenca.

Se já era difícil para mim, um menino, gostar de uma menina, imagino como seria se meu coração batesse forte por alguém do mesmo sexo.
Tenho certeza de que agora, enquanto lêem esse texto, muitas garotas estão ficando nervosas.
Talvez as bochechas tenham corado. O coração acelerado. São garotas que, assim como eu, quando se deitam na cama, pensam em alguma Luana, com muito amor – e culpa. Por que será que é assim? Por que é tão complicado aceitarmos que garotos possam amar garotos e garotas apaixonem-se por garotas? Realmente, não sei. A homossexualidade é tão velha quanto o preconceito.


O que aprendi da Luana pra cá, é que se tem alguma ordem da qual não podemos fugir é a do próprio desejo. E isso é bom. É como se houvesse uma bomba-relógio dentro da gente, cujo tique-taque nos obrigasse a caminhar em direção à felicidade. Não temos escolha: ou lutamos pelo que queremos ou definhamos. No caso de um pedaço de bolo, da vontade de sair na véspera de uma prova ou outra coisa menos, beleza: abrimos mão do que desejamos e engolimos achateação. No caso do amor, não: durante nossa breve passagem pela Terra, não encontraremos nada mais sério do que ele. nem o trabalho, nem a poesia, o dinheiro, a seleção brasileira, o mico-leão-dourado, a capa da revista, nada, nada pode vir antes do amor na ordem geral das coisas.


Feliz ou infelizmente, para homo ou heterossexuais, não há livre arbítrio nas coisas do coração. Não elegemos a pessoa por quem nos apaixonamos.
Apenas descobrimos, com as pernas bambas, as mãos suadas e uma flecha no peito, que é aquele ou aquela ali que queremos embaixo dos nossos lençóis. Conquistá-lo, conquistá-la e mudar o mundo se preciso for, para ficarmos como ele ou ela é a nossa única opção.


Se a pessoa em quem você pensa na cama, quando fecha os olhos, é uma garota, não há nada de errado. O caminho talvez seja um pouco mais duro, alguns vão achar estranho e talvez haja risadinhas pelas costas, mas isso tudo é fichinha perto da imensa felicidade que nasce quando, olhos nos olhos, vocês disserem “eu te amo”. A única tragédia afetiva é não amar. O resto a gente resolve.